Ligia Bahia, pesquisadora do GPDES, comentou ao Outras Palavras sobre a composição do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o “Conselhão”. Leia a seguir:
Em 4 de maio, o governo Lula anunciou a retomada do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, mais conhecido como Conselhão, grupo de caráter não deliberativo que reúne os mais diversos membros da sociedade civil, com vistas a auxiliar o governo na formulação de políticas públicas. No entanto, no âmbito da saúde, a diversidade parece não ter sido o forte da formação do grupo. Como mostrou matéria de Viomundo, quase todos os 14 membros são ligados a grandes grupos econômicos da saúde. A exceção é Rosana Onocko, presidente da Abrasco e professora da Faculdade de Ciências Biomédicas da Unicamp. Entrevistada pela jornalista Conceição Lemes, a médica Ligia Bahia afirmou que “no Brasil, que acaba de experimentar uma tragédia sanitária, a expectativa de recriação de instância participativa para assessorar diretamente o Presidente da República era de ver presentes os que tocam o SUS, os que deram a cara a tapa para mitigar mortes e sequelas. Seria previsível também incluir representantes da enfermagem, agentes comunitários da saúde, infectologistas, cientistas, tanta gente que esteve incansavelmente no front da batalha contra o desprezo pelas vidas da população brasileira. Mas não foi isso que aconteceu”.
Dois sistemas dentro de um
Na visão de Ligia Bahia, a conformação do grupo conflita diretamente com a organização institucional do setor de saúde no Brasil, que não passa só pelo ministério como ainda conta com o Conselho Nacional de Saúde, fórum permanente de Estado, a congregar representantes da sociedade civil e usuários do SUS. E, num contexto onde o setor privado passa por um momento de crise, com denúncia de usuários de cancelamento de planos de usuários que fazem tratamentos caros e incapacidade de arcar com o piso da enfermagem, tal grupo pode se tornar mera caixa de ressonância de uma agenda paralela ao SUS. “Governos democráticos podem e devem auscultar e estimular processos participatórios amplos incluindo interesses privatistas. O que precisamos evitar é a inversão das prioridades com o risco do Conselho Nacional de Saúde se tornar um ‘conselhinho’. Empresários em um fórum e o SUS em outro podem intensificar a fragmentação e segmentação do sistema de saúde. O sinal de alerta acendeu: essa clivagem não está orientada para a efetivação do SUS”, finalizou.